
Por Erlon Ortega
30 de junho de 2025Um modelo mais justo para os supermercados e os vouchers de alimentação
Confira o artigo exclusivo do diretor comercial da Rede Serve Todos e Presidente da APAS, Erlon Ortega, para a SuperVarejo
O setor de vale-alimentação e vale-refeição movimenta cerca de R$ 200 bilhões por ano no Brasil. Isso representa 1,7% do PIB, de acordo com a ABRAS (Associação Brasileira de Supermercados), e impacta diretamente mais de 22 milhões de trabalhadores.
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Nos últimos tempos, um tema que afeta consideravelmente o varejo alimentar e, consequentemente, os consumidores vem ganhando cada vez mais espaço nas discussões entre os supermercadistas: as elevadas taxas cobradas pelas empresas de vales-alimentação e refeição nas operações realizadas com seus cartões, que operam sob o chamado arranjo fechado. Nesse modelo, as próprias empresas emissoras controlam todas as etapas da operação — emissão dos cartões, credenciamento dos estabelecimentos e processamento das transações — o que limita a concorrência, dificulta a transparência e resulta em custos significativamente mais altos para os estabelecimentos. Um modelo que se tornou disfuncional para quem vende, sem trazer benefícios reais para quem compra.
Criado em 1976, o PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador) é uma iniciativa meritória e relevante programa social do Governo Federal. Incentiva as empresas a fornecerem alimentação aos seus colaboradores, e o programa contribui para a saúde, o bem-estar e a produtividade de milhões de brasileiros. No entanto, passadas quase cinco décadas, é inevitável discutir a modernização de sua operacionalização.
O mercado mudou, e as operadoras privadas que operacionalizam o programa se transformaram em um verdadeiro sistema financeiro, com a retirada de R$ 10 bilhões anuais do poder de compra do benefício, sobrecarregando os estabelecimentos afiliados, enquanto a tecnologia disponível torna obsoleta e desnecessária a existência das operadoras de voucher alimentação e refeição.
Hoje, quando o consumidor paga sua compra no supermercado com cartão de crédito ou débito, o estabelecimento arca com uma taxa que varia entre 1,2% e 0,50%, respectivamente. É um custo administrável, alinhado com a lógica do varejo. Mas, se o pagamento é feito com vales-alimentação ou refeição — os chamados vouchers de arranjo fechado —, essa taxa pode chegar a até 15%, especialmente para pequenos varejistas. Em uma compra de R$ 100,00, isso significa que o supermercado ou o restaurante recebe apenas R$ 90,00, caso a soma das taxas cobradas seja de 10%. E os prazos de repasse do valor transacionado são mais longos, com a possibilidade de ultrapassar 30 dias, além da cobrança de taxas de antecipação de recebíveis exorbitantes.
A conta não fecha. Atualmente, cerca de 9,6% das compras nos supermercados, que concentram 70% das transações de voucher alimentação e refeição no Brasil, são realizadas nesta modalidade. Essa diferença substancial nas taxas representa um impacto significativo na composição de custos operacionais do setor e, inevitavelmente, acabam repassadas ao preço final dos produtos para o consumidor.
A APAS (Associação Paulista de Supermercados), por exemplo, não se opõe ao uso dos vales. Ao contrário, reconhece sua importância como instrumento de segurança alimentar. Mas é preciso que esse sistema seja operado com equilíbrio. Não é razoável que empresas que atuam como intermediárias em transações de alimentos cobrem taxas tão superiores às praticadas no mercado de meios de pagamento em geral.
Uma atualização na legislação, nos últimos anos, abriu espaço para o mercado de arranjo aberto, modelo em que os cartões de benefícios (VA e VR) funcionam de forma semelhante aos cartões de débito e crédito tradicionais, utilizando as bandeiras de pagamento e que são aceitos por qualquer estabelecimento credenciado na rede da bandeira.
Neste retrato, as taxas negociadas são as mesmas do cartão de crédito (menores do que as cobradas pelas operadoras tradicionais de vales). Devido à concorrência entre as bandeiras, o modelo de arranjo aberto atualmente é uma grande oportunidade para o setor supermercadista reduzir o pagamento das taxas se comparado ao arranjo fechado nas vendas ao consumidor final.
A ABRAS (Associação Brasileira de Supermercados) tem dialogado com o governo federal, que já demonstrou sensibilidade ao tema. Mas ainda aguarda uma definição concreta sobre mudanças no PAT. O que está em jogo é mais do que a margem de lucro dos intermediários, é o acesso da população a alimentos de qualidade por preços justos.
A proposta da ABRAS considera a alternativa de modernização, inovação tecnológica e redução dos custos de operação do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), por meio de uma conexão direta, sem intermediários, com ampliação da disponibilidade do benefício alimentação a favor dos beneficiários.
A APAS está acompanhando as mudanças e evolução do PAT e orientando os seus associados acerca das melhores práticas. O setor supermercadista quer continuar contribuindo com a segurança alimentar dos brasileiros, ao oferecer acesso a produtos de qualidade e com preços justos. Para isso, é necessário um ambiente de negócios que seja também justo para quem vende e para quem compra, especialmente com a garantia do poder de compra dos beneficiários do PAT. É hora de corrigir distorções, equilibrar interesses e construir um sistema mais transparente e sustentável, para empresas, consumidores e trabalhadores.
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