Por Fabrícia Botelho
17 de dezembro de 2024O absurdo que nos move: um novo olhar para 2025
Confira o novo artigo exclusivo de Fabrícia Botelho, consultora de inovação, para a SuperVarejo
O fim de mais um ano vai chegando e é impossível, pelo menos para mim, não ficar reflexiva. Todo ano agradeço à natureza por ter dado a dica, com seus ciclos maravilhosamente organizados, aos babilônicos, sumérios, egípcios seja qual deles que tenha observado esses fenômenos e entendido que esses ciclos se repetiam a cada cerca de 360 dias e então criado o ANO.
Ah, se o ano não existisse, o que seria de nós, principalmente nos dias de hoje em que não paramos para nada? Claro que em algum momento da história alguém teria inventado, pois é impossível não parar, é pesado não fechar ciclos. Precisamos deles para nos organizar e seguir em frente, mesmo que no dia 1º de janeiro nada mude.
Mas pelo menos paramos para refletir um pouco, não importando a cultura e religião, todos tem o seu ciclo anual. Se alguém, pelo menos no fechamento de um ciclo, não está parando para refletir sobre o paradoxo do mundo atual, não está entendo o que está acontecendo: super tecnologia facilitando tudo e aumentando a expectativa de vida versus guerras escalando e ceifando vidas, geralmente jovens, fazendo diminuir a expectativa de vida. Citando só uma das situações de forma bem resumida e simplista, da realidade na qual nos encontramos e que pesa na hora de fazer planos pessoais e profissionais de médio e longo prazo, estabelecer metas de ano novo e sonhar com um mundo um pouco melhor e mais justo para todos.
Em momentos de reflexão busco consolações na filosofia, que tenho estudado apesar de estar apenas arranhando a superfície, e nesse fim de ano, busquei uma das aulas que tive com meu professor Osvaldo, em que falamos sobre Albert Camus, onde ele diz que “o homem é o único animal que se recusa a ser o que é”. Os existencialistas são ótimos para nos ajudar encontrar algum sentido nesse caos.
Nessa reflexão, Camus capturou a essência da condição humana: a resistência constante contra a realidade. Diferentemente dos outros seres vivos, que aceitam suas existências de forma instintiva e inquestionável, o homem se recusa a se limitar à sua natureza. Ele questiona, sonha e desafia sua própria finitude, criando valores, significados e sistemas que buscam dar sentido ao absurdo de sua existência. Essa reflexão de Camus continua extremamente relevante para os desafios contemporâneos que enfrentamos nas esferas pessoal, profissional e espiritual.
Na vida pessoal, o ser humano vive uma eterna insatisfação consigo mesmo, falo por mim, mas acho que mesmo os que se acham bem resolvidos, em algum momento também se sentem assim. O mundo atual, marcado pelo excesso de informações e pelas redes sociais, impõe ideais inalcançáveis de sucesso, beleza e felicidade. A recusa em ser “o que se é” pode ser vista aqui como um esforço constante de superação, mas também como uma armadilha. Ao tentar ser algo além de si mesmo, o homem muitas vezes se desconecta da própria identidade e essência. A busca incessante por validação e comparação cria um vazio existencial: uma vida onde o “ser” é sufocado pelo “parecer”. Camus nos convida a olhar para essa recusa com lucidez, propondo que a verdadeira revolta deve ser uma busca autêntica de si mesmo, não a submissão a ideais externos que nos alienam.
No campo profissional, a recusa em aceitar a própria condição se manifesta como ambição e inovação. Essa característica humana nos impulsiona a desafiar o status quo, criando tecnologias, métodos e soluções para os problemas do mundo. No entanto, essa busca por progresso também traz consequências: a exaustão mental e o esgotamento, fenômenos cada vez mais comuns em um mundo movido pela produtividade excessiva. O homem moderno, pressionado por metas e expectativas, vive em uma luta constante contra o tempo. A recusa de Camus, nesse contexto, pode ser vista como positiva quando nos leva a criar e evoluir, mas perigosa quando nos afasta da contemplação e do equilíbrio. Para Camus, é preciso saber viver a revolta sem perder a humanidade. Trabalhar deve ser mais do que apenas produzir; deve ser uma manifestação criativa da própria existência.
Espiritualmente, a recusa em aceitar a própria condição se expressa na busca pelo transcendente. A humanidade, consciente de sua finitude, luta contra o absurdo da vida criando religiões, filosofias e sistemas de crenças que buscam preencher o vazio existencial. O homem não aceita que sua vida seja apenas um acidente biológico, então cria narrativas que o conectam a algo maior. Camus, porém, nos alerta para o perigo de se perder em ilusões reconfortantes. O desafio espiritual contemporâneo é encontrar sentido sem negar a realidade absurda da vida. A verdadeira revolta espiritual consiste em abraçar a própria condição com coragem e lucidez, aceitando que a vida pode ser bela mesmo sem um significado definitivo.
Em um mundo cada vez mais acelerado e exigente, a recusa humana em ser “o que é” pode ser tanto uma bênção quanto uma maldição. Por um lado, ela nos impulsiona a evoluir, a criar e a resistir. Por outro, pode nos aprisionar em buscas vazias e inalcançáveis. O pensamento de Camus nos desafia a encontrar equilíbrio nessa luta: aceitar o absurdo da vida, mas continuar a viver com paixão e propósito. Revoltar-se contra a condição humana, afinal, não é negá-la, mas transcendê-la com autenticidade e dignidade.
Pode não parecer, mas sou bem otimista, e para 2025, eu desejo para você, o que desejo para mim, que nos recusemos a ser o que somos de forma equilibrada e que isso nos ajude a crescer como ser humano e como profissional para nos sentirmos felizes com o caminho que estamos trilhando na maior parte do tempo.
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“Eu desejo para você, o que eu desejo para mim” amei Fabricia Botleho
Maravilhosa reflexão. Parabéns pela lucidez!!!
Texto muito bom! Parabéns!